segunda-feira, 20 de setembro de 2010

A Terceira Revelação

Poema épico Espírita em decassílabo (ainda em elaboração)


Canto I


Sinopse : Apresentação de algumas epopéias; Devido ao Espiritismo não ser místico os personagens mitológicos aqui são dispensados; O Espiritismo é apresentado como a Terceira Revelação; Algumas diretrizes do Espiritismo; Eventos pré-espírita; As Irmãs Fox; Andrew Jackson Davis; As mesas girantes; A descoberta de Kardec do plano espiritual através das mesas girantes.


Peço licença às Musas1 cantadas
No passado por bardos talentosos
Como Homero, cego rapsodo
Cantou sua extensa obra heróica bela,2
Descrevendo façanhas dos heróis
Corajosos dedicados lutaram;
E dos deuses do Olimpo tão famosos.
Como os gregos e os troianos combateram,
E a volta de Ulisses que vingou,
Todas duas epopéias terminaram.
Também o poeta; Roma divulgou:
Ao qual também os deuses inspirador
Virgílio, igualmente retratou3
Enéias de origem troiano foi o fundador
Da esplêndida nação romana eterna
Combateu pelo povo e conciliador.
E o lusitano Camões que cantou4
Decassílabos versos tão heróicos
Portuguesas façanhas que fizera.
Que nos mares as côncavas velozes
Naus buscavam abrir livres veredas.
Os ferozes mercados conquistar.
E os brasileiros, lindas, belas letras
Espalharam poemas bem rimados,
Cultura dóceis versos sentimentos.
Bem como os dois Gonçalves, tão letrados5;
E mais, Castro Alves, ícone foi brasão
Da lista grandes bardos incontáveis.
Assim, não é preciso alto escalar
A montanha Aônia6 para as musas dizer
Aos deuses ; dispensados estarão.
Sinto-me livre para declarar
Versos desta epopéia irrestrita
Dispensando os enfeites mitológicos7.
Quero declarar a Doutrina Espírita
Todo o seu movimento revelador.
Que antes chamava-se Espiritista.
Peço agora ao Mentores que me ajudem
Com a inspiração amiga fraternal
A cantar com os versos tão narrador8
Toda a epopéia Espírita bendita
Que é considerada a Terceira
Revelação que Deus nos permitiu,
Sendo a primeira co’as leis de Moisés
Divulgador de um Deus unicamente
Unicidade de um Deus concebeu.
Do povo hebreu foi o libertador.
E no Monte Sinai que recebeu
As Tábuas com escritas leis em linhas
Todo Dez Mandamentos ordenados.
Divulgador das sábias leis divinas
Luz que iluminou as vias da humanidade,
De um povo com missão e também com sina.
Leis que até hoje são ainda dos caminhos
Guias para espiritual evolução.
Moisés foi o libertador de seu povo
Mas não chegou à Terra Prometida.
A seguinte segunda revelação
Foi o advento de Jesus mestre amado.
Já co’a humanidade em outra estágio
De evolução moral adiantado
As novas leis divinas: o Evangelho.
Seria eternamente ensinado.
O Cristo com a antiga lei eterna
Sabiamente ajuntou a vida futura
E fez da divindade o Evangelho.
O misericordioso justo e bom,
Bem fez do amor de Deus a caridade
Co’o próximo irmão toda candura:
“Amai a Deus sobre todas coisas, bem
Como ao próximo vós vos amaivos,
É nisto que resume todas leis”.
Nesta crença assentou todo o princípio
Da igualdade dos homens para Deus
E da fraternidade universal.
Mas o Cristo não ensinou tudo:
“Muitas das coisas que a vós vos digo
Vós não podeis compreender ainda agora,
Mais tarde porém, o Consolador
Restabelecerá todas as coisas
E que todas as coisas se explicarão”.
Assim, o Espiritismo é a Terceira
Revelação, que a tudo o que não foi
Dito e compreendido se fará.
Esta revelação é coletiva,
Não é obra de um indivíduo simplesmente
Não tem nenhum profeta exclusivo. 80
Foi espalhada na Terra simultâneo
Há milhões de pessoas de várias partes,
Não proveio de nenhum culto que é especial
E não surgiu num só ponto local.
O Espiritismo vindo numa época
De uma maturidade intelectual,
Onde o homem não aceita bem passível.
Quer saber o porquê e o como das coisas.
Numa época das leis racionais,
Onde as leis da matéria não explicavam 90
O sobrenatural como os fenômenos.
O Espiritismo tendo objeto
Estudar todos dois os elementos,
Então mantém contato com as ciências.
Sendo tríplice a sua constituição.
Pela mediunidade surgiu a Doutrina
Que cresceu com mil vozes dizendo
Ao mesmo tempo das coisas divinas.
De várias formas a verdade veio,
A luz que se espalhou da Doutrina 100
Só onde a razão com fé espalhou correndo.
Dizeres dos Espíritos declarou
Pois quê, quando a verdade vem de fato
Não é uma só voz que se justifique.
E assim nasceu a Doutrina que a razão
Faz a fé sustentáculo da vida.
Seu ponto principal, a reencarnação
É a bendita resposta dos segredos
Que outros credos não podem bem responder.
A ciência não resolve estas questões 110
Que incomodam o Ser com as dúvidas:
Quem sou? Para onde vou? Mas o que é a morte?
Porque existe a pobreza?, a diferença?
Qual a razão da doença? Da morbidez?
O que há depois da morte? Existe o inferno?
O nada existe? Ou é só ilusão?
Mediante estes com outras questões várias,
Tem sua finalidade em esclarecer
As mentes das verdades superiores
Nobres espirituais, como as morais. 120
Bem promover nos homens as mudanças
Morais indispensáveis na redenção
Individual à mundos superiores.
Rever o Cristianismo primitivo
Nas essências dos seus ensinamentos
E nos termos expressos pelo Mestre
Divino e a sua gloriosa sã tarefa.
O Espiritismo não é um conhecimento
Teórico ou especulativo simplesmente,
É iniciação em verdades maiores plenas. 130
Bem, é o devotamento para o próximo,
Busca para a reforma toda íntima.
Mas a Doutrina não apareceu
Como aparecem rápido uns eventos,
Bem desde a antiguidade a humanidade
Sempre apresentou certas demonstrações
Como comunicações com o plano
Espiritual; mas só que relatarei
Do período da véspera que nasceu
A Doutrina Espírita, a Terceira 140
Última Revelação, tão bendita.

Citamos Edward Irving que
Nasceu na Escócia, classe nível pobre.
Era cura na igreja que viveu
Sob manifestações que ocorriam
Tanto em sua residência e na sua igreja.
Outro foi Andrew Jackson Davis nasceu
As margens do rio Hudson, também tinha
Visões desde pequeno que bem passou
Usar clarividência em diagnosticar 150
Doenças, pois, cada órgão do paciente
Era enxergado muito claramente.
Viveu também em missão humanitária,
Se projetava fácil de seu corpo.
Mas o mais conhecido e relatado,
Dado comum exemplo, as irmãs Fox.
Na aldeia de Hydesville, um condado
Bem pequeno de Wayne em Nova Iorque:
Numa noite de Março nas paredes 9
De madeira da casa de John Fox, 160
Começaram a soar pancadas fortes
Bem incomodativas, perturbando
Tranqüilo sono de toda família.
Tanto a menina Katie e Margaretta,
Correram para o quarto de seus pais.
A casa, um barracão, que era construído
Quase perto em terreno pantanoso,
Onde que alicerces feito em pedra
E também com tijolos até altura
Da adega que então daí surgiam paredes 170
Roda de tábuas, era então bem simples.
Últimos ocupantes confessaram
Mais tarde, ter ouvido ali batidas
Na porta e também passos na adega.
Após três dias seguidos sem dormir,
Foi bem recomendado às crianças
Que não se referissem aos tais ruídos
Tendo que mesmo elas os ouvissem.
Porém, nada obstou para as pancadas
Voltassem e tornando verdadeiros 180
Barulhos estrondosos que no quarto
Faziam bem tremer todos os móveis.
As meninas nas camas assentaram
Onde John Fox resolveu dar ua busca
Pelo interior completa do pequeno
Barracão. Não encontrando tal mistério.
Kate, a filha mais jovem do casal
Muito esperta mais tanto ao fenômeno
Acostumada, pôs-se num momento
Às pancadas imitar, e batendo 190
Sobre um móvel com finos dedinhos
“Vamos, old splitfoot, faça o que faço!”
Prontamente as pancadas se fizeram
Ouvir em igual número e paravam
Quando a Kate também da mesma forma.
Margaretta também brincando disse
Pedindo ao espírito seguir
Também as suas batidas com os dedos.
Foi-lhe satisfatoriamente feito
Deixando todos estupefados. 200
Naquela mesma noite foram várias
Perguntas feitas pelos tão humildes
Moradores e outros seus vizinhos
Que prontamente foram chamados.
Obtinha-se sempre tão precisas
Respostas, pedidas muitas questões.
Então o comunicante invisível
Narrou a sua triste história que se segue:
“Foi um vendedor ambulante que
Moradores antigos que moravam 210
Naquela mesma casa assassinaram
Já uns cinco anos p’ra o furtar-lhe
Todo o dinheiro na bolsa trazia.
O seu corpo se achava sepultado
Bem no porão daquela mesma casa.
Mais tarde descobriu-se que o casal
De sobrenome Bell, sem nenhum filhos
Só tinham uma criada: a Lucretia,
Que não raro dormia em casa dos pais.
Então, feito um inquérito, a chamaram 220
Pois o casal já havia a muito tempo
Que desaparecidos da cidade.
Ela respondeu que bem se lembrava
Que certo dia um vendedor ambulante
Apareceu no barracão e os patrões
Mandaram-na dormir lá com seus pais
Podendo-se o hóspede dormir
Pernoitando no quarto de Lucretia.
Mas pela manhã ela compareceu
Naquela casa dos patrões e soube 230
Que o vendedor partira muito cedo.
Devido ao depoimento que obtido
Pelo espírito batedor, foi feito
Profunda escavação no porão;
Foi encontrado só carvão, também cal,
Um pouco mais ao fundo viram ossos.
Mas por ser incompleto, os incrédulos
Bem duvidaram sobre a revelação.
Passou quase meio século mais tarde,
Quando alguns escolares da aldeia 240
Brincando no local do barracão
Que já estava em ruínas, bem notaram
Onde a parede interna havia caído
E junto do alicerce, um esqueleto
Humano quase inteiro ficou exposto.
Confirmara-se assim, declaração
Do espírito vendedor ambulante
Onde que o casal Bell o assassinaram.
Então as irmãs Fox muito viajaram
Mas não adiantava, pois onde paravam 250
Ou hospedavam, as tais batidas vinham
Travando conversação com espíritos.
E processando muitos tão fenômenos
Notou-se então que as Fox, elas possuíam
Faculdade especial que outras pessoas
Também eram dotadas semelhantes
Dotes de faculdades, que ao contato
De suas mãos numa mesa provocava
Pancadas e também se levantava
E estas pancadas bem que respondiam 260
Perguntas muito sérias inteléctas.”
Este acontecimento foi prelúdio
Dos mais famosos fatos registrados.

Começava ua era que se despontava
Como numa paisagem que nublado
Sem poder ver campinas tão cobertas
De fortes relvas verdes fotossíntese
E que sustenta vasto arvoredo
Com sua copas que sentem as alturas.
Assim, então as neblinas se dispersam 270
Lentamente deixando que o rei Sol
Com sua prateada luz, mostra que bela
Aparição estava escondida.
As revelações são sempre mostradas
Nos seus devidos tempos tão preciosos,
De suas maneiras certas bem corretas.
O Espírito precisa de cadência,
Moderação, cuidado e atenção.
Não percebendo a forte luz reflete
Imagens tão esparsas que não enxerga, 280
Precisando das sombras em alívio
Para os olhos cansados e que doendo.
Este novo período começava
Com inúmeros fatos fenomênicos
Junto com a razão compreendessem
Em vias de muito rápido surgir.

Mas voltamos mais ua vez ao Andrew
Jackson Davis, já por nós citado,
Pois, daremos ua pausa bem mostrando
Que as revelações surgem lentamente, 290
E foi considerado o pai moderno
Do Espiritismo e como foi o Kardec
Americano, alcunha bem devido:
Filho de pais humildes mesmo incultos
Nasceu às margens do longo rio Hudson10
Entre simples pessoas ignorantes.
Era um menino que pouco falava,
Falta de atividade intelécta,
Corpo mirrado, sem traço nenhum
Que mostrasse futuro dom de um médium. 300
Nos anos da infância, agradáveis
Vozes já bem sopravam como câdidas
Preludiando tão forte sensitivo,
Seguida belas foi a clarividência
E diagnosticando sinais médicos
Mas sua mediunidade, com o tempo
Progredindo, ganhando novos rumos.
Quando em transe falava várias línguas.
Expunha admiráveis teor do saber.
Sua pessoa chamou logo a atenção 310
De muitos homens sérios, muito cultos
E em dois anos ditou em transe inconsciente
Um livro co o título “Princípios
Da Natureza”, obra tão bem feita.
Quando suas faculdades medianímicas
Chegaram com o maior seu desenvolver,
Pode bem melhor ver observando
Processo natural desencarnação.
Previu maior e intensa mais futura
Relação ostensiva dos Espíritos 320
Com todas as criaturas só humanas
De uma forma tão bem inteligente.
Em uma de suas notas tem um trecho11:
“ Bem nesta madrugada um sopro fresco
Passou pelo meu rosto, e ouvi uma voz
Suave e firme dizer-me: Irmão foi dado
Início a um bom trabalho; contempla
A demonstração viva que bem surge.”
Muito longe estava ele de supor
Justamente na noite do citado 330
Dia então, que as irmãs Fox conversariam,
Bem por meio de batidas com o Espírito.
Jackson sofreu várias acusações
Caluniosas e críticas acerbas.
A tudo superior se sobrepunha
Com tolerância e larga compreensão.
Desencarnou de forma muito digna12.

Bem mais perto desta época, se tinham13
As atenções gerais na Europa inteira
Tão convergidas para os fenômenos 340
Denominadas “as mesas girantes”,
Onde os salões cheios da aristocracia
Parisiense reunia-se todas noites
Que em torno de mesas bem redondas,
Espalmando as mãos pouco acima delas,
Formando uma corrente com contato
De todos dedos mínimos, no intuito
De fazer com que as mesas movimentar.
Era um divertimento diferente
Que as mesas com pancadas respondiam 350
E se movimentavam para os lados.
O passatempo passou também para
As casas parisiense em geral.
A este fato Kardec comentou:
“Eu ainda nada vira e observara;
Experiências que realizadas pela
Presença de pessoas honradas, dignas
De boa fé, confirmavam opinião
Minha quanto a possível possa ser
O efeito puramente material”. 360
E kardec fazendo as perguntas
Inteligentes, bem tinha as respostas
Também inteligentes, descobrindo
Bem então, desta forma todo o mundo
Espiritual, partindo a codificar
A Doutrina Espírita por fim.












Canto II

Sinopse : x.


Ainda peço aos Mentores que me ajudem
Nesta segunda parte bem narrar
A História daquele trabalhador
Incansável, também codificador
Do Espiritismo, foi tão labutador.
Kardec como ficou conhecido14
Nasceu em Lião na França em videmiário.15
Recebeu desde o berço belo nome,
Toda uma tradição de honra e virtudes
E probidade inúmeros dos pais. 10
Fez estudos primeiros na cidade
De Yverdun (na Suíça), com famoso
O mestre Pestallozzi, do qual entre
Poucos, Kardec se fez um dos sábios
Alunos eficiente dedicado.
Com toda calma, fez-se propaganda
Do sistema que foi educacional
Que exerceu reforma dos estudos
Ocorridos em França e Alemanha.
Inúmeras foram as vezes quando 20
Pestallozzi ausentava da escola,
Kardec que ficava em seu lugar
Substituindo-o na diretoria
Por sua capacidade necessária.
Bacharelou-se em letras e em ciências,
Doutorou-se também em medicina.
Insigne lingüista, conhecia
E falava o alemão, o italiano,
O inglês, o espanhol; também o holandês
Nesta língua podia se expressar. 30
Pouco alto e belo moço, de maneiras
Bem distintas e que bem-humorado,
Sempre entre os amigos foi bondoso.
Kardec encontrou no meio das letras,
E no mundo do ensino a senhorita
Amélie Boudet, que era professora.
Baixa estatura, mas de harmoniosas
De simples proporções, finas graciosas.
Soube com seu sorriso e atributos
Bem fazer-se notada por Kardec 40
Selando por fim, belo casamento.
O que não podia ser diferenciado
Da vida de outros homens destacados,
Que tiveram ao seus lados pilares
De forte sustentáculo e estímulo
Que grandemente bem fortalecessem.
É aquela outra alma que no mesmo
Caminho e missão, faz o complemento.

Seguindo sua carreira pedagógica,
Bem poderia Kardec levar vida 50
De uma existência calma e afortunada,
Construída trabalhando com brilhante
Êxito, bem coroado pelo esforço.
Mas a sua verdadeira missão irá
Chamar para tarefa dispendiosa,
Uma obra mais excelsa e espiritual.
Pois suas tendências se dirigiam para
As observações muitos metódicas,
Livres das formas místicas pueris
Pondo-o nas relações puras e lógicas. 60

E quando, da primeira vez que ouviu
Falar girantes mesas com Fortier16
Que lhe disse “que bem extraordinário:
Não apenas se faz girar uma mesa,
Pergunta-se e ela bem responde”.
“Como?”, pensou Kardec; uma coisa
Inanimada dar respostas feitas?
A partir disso, daí que foi Kardec
Iniciar seus estudos seriamente
O Espiritismo, menos que devido
À revelações do que observações.
Sujeitou essa nova ciência , como
Ao método de via experimental.
Preconcebidas teorias não fez.
Acuradas atendeu observar,
Comparava, tirava conseqüências,
Pelos efeitos, via todas as causas,
Pelo encadear lógico dos fatos.
Aprendeu desde o início a gravidade
Da exploração que dado realizado.
Percebeu nos fenômenos a chave
Do problema obscuro discutido
Tão forte do passado e do futuro.
Foi uma reviravolta nas idéias
Tanto quanto nas crenças ainda vivas.
Conclusões suas primeiras, constatou
Que os espírito, sendo apenas almas
Dos homens, não possuíam sabedoria
Soberana, nem toda e total ciência.
Seu saber media à sua evolução.
Era revolução tanto nas crenças;
Como todas idéias tidas atuais.
Fazia-se necessário ser e agir
Circunspeta e não levianamente,
E ser positivista e não idealista,
Não deixando as paixões lhe arrastassem.
Saber era adistrito ao grau de seu
Atual estado de evolução,
E que sua opinião era só seu valor.
Esta verdade, desde o seu princípio
Entendida, evitou o grave obstáculo
De Kardec pensar em que os espíritos
Possuíssem o dom de infalíveis.
A comunicação com os Espíritos
Provava existir o mundo invisível,
Constituindo vasto campo aberto
Às incontáveis formas de explorar
E conhecer um mundo diferente.



















Canto I


Sinopse : Apresentação de algumas epopéias; Devido ao Espiritismo não ser místico os personagens mitológicos aqui são dispensados; O Espiritismo é apresentado como a Terceira Revelação; Algumas diretrizes do Espiritismo; Eventos pré-espírita; As Irmãs Fox; Andrew Jackson Davis; As mesas girantes; A descoberta de Kardec do plano espiritual através das mesas girantes.


Peço licença às Musas1 cantadas
No passado por bardos talentosos
Como Homero, cego rapsodo
Cantou sua extensa obra heróica bela,2
Descrevendo façanhas dos heróis
Corajosos dedicados lutaram;
E dos deuses do Olimpo tão famosos.
Como os gregos e os troianos combateram,
E a volta de Ulisses que vingou,
Todas duas epopéias terminaram.
Também o poeta; Roma divulgou:
Ao qual também os deuses inspirador
Virgílio, igualmente retratou3
Enéias de origem troiano foi o fundador
Da esplêndida nação romana eterna
Combateu pelo povo e conciliador.
E o lusitano Camões que cantou4
Decassílabos versos tão heróicos
Portuguesas façanhas que fizera.
Que nos mares as côncavas velozes
Naus buscavam abrir livres veredas.
Os ferozes mercados conquistar.
E os brasileiros, lindas, belas letras
Espalharam poemas bem rimados,
Cultura dóceis versos sentimentos.
Bem como os dois Gonçalves, tão letrados5;
E mais, Castro Alves, ícone foi brasão
Da lista grandes bardos incontáveis.
Assim, não é preciso alto escalar
A montanha Aônia6 para as musas dizer
Aos deuses ; dispensados estarão.
Sinto-me livre para declarar
Versos desta epopéia irrestrita
Dispensando os enfeites mitológicos7.
Quero declarar a Doutrina Espírita
Todo o seu movimento revelador.
Que antes chamava-se Espiritista.
Peço agora ao Mentores que me ajudem
Com a inspiração amiga fraternal
A cantar com os versos tão narrador8
Toda a epopéia Espírita bendita
Que é considerada a Terceira
Revelação que Deus nos permitiu,
Sendo a primeira co’as leis de Moisés
Divulgador de um Deus unicamente
Unicidade de um Deus concebeu.
Do povo hebreu foi o libertador.
E no Monte Sinai que recebeu
As Tábuas com escritas leis em linhas
Todo Dez Mandamentos ordenados.
Divulgador das sábias leis divinas
Luz que iluminou as vias da humanidade,
De um povo com missão e também com sina.
Leis que até hoje são ainda dos caminhos
Guias para espiritual evolução.
Moisés foi o libertador de seu povo
Mas não chegou à Terra Prometida.
A seguinte segunda revelação
Foi o advento de Jesus mestre amado.
Já co’a humanidade em outra estágio
De evolução moral adiantado
As novas leis divinas: o Evangelho.
Seria eternamente ensinado.
O Cristo com a antiga lei eterna
Sabiamente ajuntou a vida futura
E fez da divindade o Evangelho.
O misericordioso justo e bom,
Bem fez do amor de Deus a caridade
Co’o próximo irmão toda candura:
“Amai a Deus sobre todas coisas, bem
Como ao próximo vós vos amaivos,
É nisto que resume todas leis”.
Nesta crença assentou todo o princípio
Da igualdade dos homens para Deus
E da fraternidade universal.
Mas o Cristo não ensinou tudo:
“Muitas das coisas que a vós vos digo
Vós não podeis compreender ainda agora,
Mais tarde porém, o Consolador
Restabelecerá todas as coisas
E que todas as coisas se explicarão”.
Assim, o Espiritismo é a Terceira
Revelação, que a tudo o que não foi
Dito e compreendido se fará.
Esta revelação é coletiva,
Não é obra de um indivíduo simplesmente
Não tem nenhum profeta exclusivo. 80
Foi espalhada na Terra simultâneo
Há milhões de pessoas de várias partes,
Não proveio de nenhum culto que é especial
E não surgiu num só ponto local.
O Espiritismo vindo numa época
De uma maturidade intelectual,
Onde o homem não aceita bem passível.
Quer saber o porquê e o como das coisas.
Numa época das leis racionais,
Onde as leis da matéria não explicavam 90
O sobrenatural como os fenômenos.
O Espiritismo tendo objeto
Estudar todos dois os elementos,
Então mantém contato com as ciências.
Sendo tríplice a sua constituição.
Pela mediunidade surgiu a Doutrina
Que cresceu com mil vozes dizendo
Ao mesmo tempo das coisas divinas.
De várias formas a verdade veio,
A luz que se espalhou da Doutrina 100
Só onde a razão com fé espalhou correndo.
Dizeres dos Espíritos declarou
Pois quê, quando a verdade vem de fato
Não é uma só voz que se justifique.
E assim nasceu a Doutrina que a razão
Faz a fé sustentáculo da vida.
Seu ponto principal, a reencarnação
É a bendita resposta dos segredos
Que outros credos não podem bem responder.
A ciência não resolve estas questões 110
Que incomodam o Ser com as dúvidas:
Quem sou? Para onde vou? Mas o que é a morte?
Porque existe a pobreza?, a diferença?
Qual a razão da doença? Da morbidez?
O que há depois da morte? Existe o inferno?
O nada existe? Ou é só ilusão?
Mediante estes com outras questões várias,
Tem sua finalidade em esclarecer
As mentes das verdades superiores
Nobres espirituais, como as morais. 120
Bem promover nos homens as mudanças
Morais indispensáveis na redenção
Individual à mundos superiores.
Rever o Cristianismo primitivo
Nas essências dos seus ensinamentos
E nos termos expressos pelo Mestre
Divino e a sua gloriosa sã tarefa.
O Espiritismo não é um conhecimento
Teórico ou especulativo simplesmente,
É iniciação em verdades maiores plenas. 130
Bem, é o devotamento para o próximo,
Busca para a reforma toda íntima.
Mas a Doutrina não apareceu
Como aparecem rápido uns eventos,
Bem desde a antiguidade a humanidade
Sempre apresentou certas demonstrações
Como comunicações com o plano
Espiritual; mas só que relatarei
Do período da véspera que nasceu
A Doutrina Espírita, a Terceira 140
Última Revelação, tão bendita.

Citamos Edward Irving que
Nasceu na Escócia, classe nível pobre.
Era cura na igreja que viveu
Sob manifestações que ocorriam
Tanto em sua residência e na sua igreja.
Outro foi Andrew Jackson Davis nasceu
As margens do rio Hudson, também tinha
Visões desde pequeno que bem passou
Usar clarividência em diagnosticar 150
Doenças, pois, cada órgão do paciente
Era enxergado muito claramente.
Viveu também em missão humanitária,
Se projetava fácil de seu corpo.
Mas o mais conhecido e relatado,
Dado comum exemplo, as irmãs Fox.
Na aldeia de Hydesville, um condado
Bem pequeno de Wayne em Nova Iorque:
Numa noite de Março nas paredes 9
De madeira da casa de John Fox, 160
Começaram a soar pancadas fortes
Bem incomodativas, perturbando
Tranqüilo sono de toda família.
Tanto a menina Katie e Margaretta,
Correram para o quarto de seus pais.
A casa, um barracão, que era construído
Quase perto em terreno pantanoso,
Onde que alicerces feito em pedra
E também com tijolos até altura
Da adega que então daí surgiam paredes 170
Roda de tábuas, era então bem simples.
Últimos ocupantes confessaram
Mais tarde, ter ouvido ali batidas
Na porta e também passos na adega.
Após três dias seguidos sem dormir,
Foi bem recomendado às crianças
Que não se referissem aos tais ruídos
Tendo que mesmo elas os ouvissem.
Porém, nada obstou para as pancadas
Voltassem e tornando verdadeiros 180
Barulhos estrondosos que no quarto
Faziam bem tremer todos os móveis.
As meninas nas camas assentaram
Onde John Fox resolveu dar ua busca
Pelo interior completa do pequeno
Barracão. Não encontrando tal mistério.
Kate, a filha mais jovem do casal
Muito esperta mais tanto ao fenômeno
Acostumada, pôs-se num momento
Às pancadas imitar, e batendo 190
Sobre um móvel com finos dedinhos
“Vamos, old splitfoot, faça o que faço!”
Prontamente as pancadas se fizeram
Ouvir em igual número e paravam
Quando a Kate também da mesma forma.
Margaretta também brincando disse
Pedindo ao espírito seguir
Também as suas batidas com os dedos.
Foi-lhe satisfatoriamente feito
Deixando todos estupefados. 200
Naquela mesma noite foram várias
Perguntas feitas pelos tão humildes
Moradores e outros seus vizinhos
Que prontamente foram chamados.
Obtinha-se sempre tão precisas
Respostas, pedidas muitas questões.
Então o comunicante invisível
Narrou a sua triste história que se segue:
“Foi um vendedor ambulante que
Moradores antigos que moravam 210
Naquela mesma casa assassinaram
Já uns cinco anos p’ra o furtar-lhe
Todo o dinheiro na bolsa trazia.
O seu corpo se achava sepultado
Bem no porão daquela mesma casa.
Mais tarde descobriu-se que o casal
De sobrenome Bell, sem nenhum filhos
Só tinham uma criada: a Lucretia,
Que não raro dormia em casa dos pais.
Então, feito um inquérito, a chamaram 220
Pois o casal já havia a muito tempo
Que desaparecidos da cidade.
Ela respondeu que bem se lembrava
Que certo dia um vendedor ambulante
Apareceu no barracão e os patrões
Mandaram-na dormir lá com seus pais
Podendo-se o hóspede dormir
Pernoitando no quarto de Lucretia.
Mas pela manhã ela compareceu
Naquela casa dos patrões e soube 230
Que o vendedor partira muito cedo.
Devido ao depoimento que obtido
Pelo espírito batedor, foi feito
Profunda escavação no porão;
Foi encontrado só carvão, também cal,
Um pouco mais ao fundo viram ossos.
Mas por ser incompleto, os incrédulos
Bem duvidaram sobre a revelação.
Passou quase meio século mais tarde,
Quando alguns escolares da aldeia 240
Brincando no local do barracão
Que já estava em ruínas, bem notaram
Onde a parede interna havia caído
E junto do alicerce, um esqueleto
Humano quase inteiro ficou exposto.
Confirmara-se assim, declaração
Do espírito vendedor ambulante
Onde que o casal Bell o assassinaram.
Então as irmãs Fox muito viajaram
Mas não adiantava, pois onde paravam 250
Ou hospedavam, as tais batidas vinham
Travando conversação com espíritos.
E processando muitos tão fenômenos
Notou-se então que as Fox, elas possuíam
Faculdade especial que outras pessoas
Também eram dotadas semelhantes
Dotes de faculdades, que ao contato
De suas mãos numa mesa provocava
Pancadas e também se levantava
E estas pancadas bem que respondiam 260
Perguntas muito sérias inteléctas.”
Este acontecimento foi prelúdio
Dos mais famosos fatos registrados.

Começava ua era que se despontava
Como numa paisagem que nublado
Sem poder ver campinas tão cobertas
De fortes relvas verdes fotossíntese
E que sustenta vasto arvoredo
Com sua copas que sentem as alturas.
Assim, então as neblinas se dispersam 270
Lentamente deixando que o rei Sol
Com sua prateada luz, mostra que bela
Aparição estava escondida.
As revelações são sempre mostradas
Nos seus devidos tempos tão preciosos,
De suas maneiras certas bem corretas.
O Espírito precisa de cadência,
Moderação, cuidado e atenção.
Não percebendo a forte luz reflete
Imagens tão esparsas que não enxerga, 280
Precisando das sombras em alívio
Para os olhos cansados e que doendo.
Este novo período começava
Com inúmeros fatos fenomênicos
Junto com a razão compreendessem
Em vias de muito rápido surgir.

Mas voltamos mais ua vez ao Andrew
Jackson Davis, já por nós citado,
Pois, daremos ua pausa bem mostrando
Que as revelações surgem lentamente, 290
E foi considerado o pai moderno
Do Espiritismo e como foi o Kardec
Americano, alcunha bem devido:
Filho de pais humildes mesmo incultos
Nasceu às margens do longo rio Hudson10
Entre simples pessoas ignorantes.
Era um menino que pouco falava,
Falta de atividade intelécta,
Corpo mirrado, sem traço nenhum
Que mostrasse futuro dom de um médium. 300
Nos anos da infância, agradáveis
Vozes já bem sopravam como câdidas
Preludiando tão forte sensitivo,
Seguida belas foi a clarividência
E diagnosticando sinais médicos
Mas sua mediunidade, com o tempo
Progredindo, ganhando novos rumos.
Quando em transe falava várias línguas.
Expunha admiráveis teor do saber.
Sua pessoa chamou logo a atenção 310
De muitos homens sérios, muito cultos
E em dois anos ditou em transe inconsciente
Um livro co o título “Princípios
Da Natureza”, obra tão bem feita.
Quando suas faculdades medianímicas
Chegaram com o maior seu desenvolver,
Pode bem melhor ver observando
Processo natural desencarnação.
Previu maior e intensa mais futura
Relação ostensiva dos Espíritos 320
Com todas as criaturas só humanas
De uma forma tão bem inteligente.
Em uma de suas notas tem um trecho11:
“ Bem nesta madrugada um sopro fresco
Passou pelo meu rosto, e ouvi uma voz
Suave e firme dizer-me: Irmão foi dado
Início a um bom trabalho; contempla
A demonstração viva que bem surge.”
Muito longe estava ele de supor
Justamente na noite do citado 330
Dia então, que as irmãs Fox conversariam,
Bem por meio de batidas com o Espírito.
Jackson sofreu várias acusações
Caluniosas e críticas acerbas.
A tudo superior se sobrepunha
Com tolerância e larga compreensão.
Desencarnou de forma muito digna12.

Bem mais perto desta época, se tinham13
As atenções gerais na Europa inteira
Tão convergidas para os fenômenos 340
Denominadas “as mesas girantes”,
Onde os salões cheios da aristocracia
Parisiense reunia-se todas noites
Que em torno de mesas bem redondas,
Espalmando as mãos pouco acima delas,
Formando uma corrente com contato
De todos dedos mínimos, no intuito
De fazer com que as mesas movimentar.
Era um divertimento diferente
Que as mesas com pancadas respondiam 350
E se movimentavam para os lados.
O passatempo passou também para
As casas parisiense em geral.
A este fato Kardec comentou:
“Eu ainda nada vira e observara;
Experiências que realizadas pela
Presença de pessoas honradas, dignas
De boa fé, confirmavam opinião
Minha quanto a possível possa ser
O efeito puramente material”. 360
E kardec fazendo as perguntas
Inteligentes, bem tinha as respostas
Também inteligentes, descobrindo
Bem então, desta forma todo o mundo
Espiritual, partindo a codificar
A Doutrina Espírita por fim.












Canto II

Sinopse : x.


Ainda peço aos Mentores que me ajudem
Nesta segunda parte bem narrar
A História daquele trabalhador
Incansável, também codificador
Do Espiritismo, foi tão labutador.
Kardec como ficou conhecido14
Nasceu em Lião na França em videmiário.15
Recebeu desde o berço belo nome,
Toda uma tradição de honra e virtudes
E probidade inúmeros dos pais. 10
Fez estudos primeiros na cidade
De Yverdun (na Suíça), com famoso
O mestre Pestallozzi, do qual entre
Poucos, Kardec se fez um dos sábios
Alunos eficiente dedicado.
Com toda calma, fez-se propaganda
Do sistema que foi educacional
Que exerceu reforma dos estudos
Ocorridos em França e Alemanha.
Inúmeras foram as vezes quando 20
Pestallozzi ausentava da escola,
Kardec que ficava em seu lugar
Substituindo-o na diretoria
Por sua capacidade necessária.
Bacharelou-se em letras e em ciências,
Doutorou-se também em medicina.
Insigne lingüista, conhecia
E falava o alemão, o italiano,
O inglês, o espanhol; também o holandês
Nesta língua podia se expressar. 30
Pouco alto e belo moço, de maneiras
Bem distintas e que bem-humorado,
Sempre entre os amigos foi bondoso.
Kardec encontrou no meio das letras,
E no mundo do ensino a senhorita
Amélie Boudet, que era professora.
Baixa estatura, mas de harmoniosas
De simples proporções, finas graciosas.
Soube com seu sorriso e atributos
Bem fazer-se notada por Kardec 40
Selando por fim, belo casamento.
O que não podia ser diferenciado
Da vida de outros homens destacados,
Que tiveram ao seus lados pilares
De forte sustentáculo e estímulo
Que grandemente bem fortalecessem.
É aquela outra alma que no mesmo
Caminho e missão, faz o complemento.

Seguindo sua carreira pedagógica,
Bem poderia Kardec levar vida 50
De uma existência calma e afortunada,
Construída trabalhando com brilhante
Êxito, bem coroado pelo esforço.
Mas a sua verdadeira missão irá
Chamar para tarefa dispendiosa,
Uma obra mais excelsa e espiritual.
Pois suas tendências se dirigiam para
As observações muitos metódicas,
Livres das formas místicas pueris
Pondo-o nas relações puras e lógicas. 60

E quando, da primeira vez que ouviu
Falar girantes mesas com Fortier16
Que lhe disse “que bem extraordinário:
Não apenas se faz girar uma mesa,
Pergunta-se e ela bem responde”.
“Como?”, pensou Kardec; uma coisa
Inanimada dar respostas feitas?
A partir disso, daí que foi Kardec
Iniciar seus estudos seriamente
O Espiritismo, menos que devido
À revelações do que observações.
Sujeitou essa nova ciência , como
Ao método de via experimental.
Preconcebidas teorias não fez.
Acuradas atendeu observar,
Comparava, tirava conseqüências,
Pelos efeitos, via todas as causas,
Pelo encadear lógico dos fatos.
Aprendeu desde o início a gravidade
Da exploração que dado realizado.
Percebeu nos fenômenos a chave
Do problema obscuro discutido
Tão forte do passado e do futuro.
Foi uma reviravolta nas idéias
Tanto quanto nas crenças ainda vivas.
Conclusões suas primeiras, constatou
Que os espírito, sendo apenas almas
Dos homens, não possuíam sabedoria
Soberana, nem toda e total ciência.
Seu saber media à sua evolução.
Era revolução tanto nas crenças;
Como todas idéias tidas atuais.
Fazia-se necessário ser e agir
Circunspeta e não levianamente,
E ser positivista e não idealista,
Não deixando as paixões lhe arrastassem.
Saber era adistrito ao grau de seu
Atual estado de evolução,
E que sua opinião era só seu valor.
Esta verdade, desde o seu princípio
Entendida, evitou o grave obstáculo
De Kardec pensar em que os espíritos
Possuíssem o dom de infalíveis.
A comunicação com os Espíritos
Provava existir o mundo invisível,
Constituindo vasto campo aberto
Às incontáveis formas de explorar
E conhecer um mundo diferente.
1932
Um romance Espírita (ainda em elaboração)




1

O sol estava quase para se pôr numa tarde de setembro no ano de 1920 na pequena cidade de Pindamonhangaba, e às margens do rio Paraíba do Sul, um menino, Alfredo, de 10 anos, sentado à frente de um casebre observava o reflexo do sol na superfície do rio que tremulava. Seu pensamento parecia estar confuso, pois lá dentro da pequena casa pobre, a sua mãe estava agonizando à beira da morte cercada por alguns vizinhos próximos que a assistia. Se ela morresse ele não saberia o que seria de sua vida, pois, Alfredo não tinha mais ninguém na família, era ele e sua mãe apenas. De repente um homem à cavalo chamou-lhe a atenção cortando os pensamentos tristes , pois era o seu Antonio. Àquele homem vinha freqüentemente à sua casa e ultimamente a sua mão obrigava-o chamar o seu Antonio de pai. Antonio, um homem rude e sério parecia não gostar.
Antonio desceu do cavalo meio vacilante, antes de entrar ficou olhando para Alfredo , numa mistura de pena e receio. Por fim entrando as pessoas saíram respeitosamente deixando-o a sós com a sua mãe.
Após meia hora, Antonio saiu de cabeça baixa e disse para uma das vizinhas que estava indo preparar o funeral, ao montar no cavalo disse para Alfredo que a sua mãe queria lhe falar, indo embora . Alfredo sentiu o carinho de uma das mulheres que lhe disse :
- Vá menino, receber uma última benção de sua mãe!
De passos lentos entrou sentando num banquinho ao lado da cabeceira de sua mãe pegando-lhe nas mãos frias. Após alguns segundos de silêncio ela com pouco mais de energia disse-lhe :
- Filho meu, meu homenzinho, ... estou morrendo filho...
Nestas palavras Alfredo começou a chorar agarrando-lhe mais forte as suas mãos.
- Escuta filho – disse a sua mãe – preste a atenção.
O menino sentindo a fraqueza dela se esforçou e fez silêncio.
- Escuta filho, o Antonio é o seu pai, há algum tempo, e eu venho te mostrando isto, e quando eu me for você irá morar com ele... é... ele tem outra família , você irá morar mais perto da cidade viu?.
Alfredo começou a chorar mais intensamente, não queria morar com gente estranha, mudar de vida, apesar de ser uma vida dura, a sua mãe trabalhava de lavadeira e ele ainda criança ajudava os adultos em uma olaria que havia ali perto.
- Vá sim filho – continuou a sua mãe fraca – partirei tranqüila sabendo que você terá um teto... Antonio está aceitando você agora como filho... finalmente.
A tosse compulsiva e o suor deixou a mãe de Alfredo com aspecto pior. As mulheres entraram rapidamente pondo o menino do lado de fora chorando.
A noite chegou rapidamente e a mãe de Alfredo agonizando morreu após longo sofrimento, Alfredo amparado pelos vizinhos igualmente como ele, gente muito pobre mas honestas e solidárias auxiliaram com apoio moral.
No dia seguinte após o velório o que para Alfredo pareceu não ter fim, o corpo foi levado para ser enterrado no cemitério da cidade. Alfredo caminhava atrás do caixão com a mente ainda confusa para uma criança de dez anos. Sua mente tentava por as idéias em ordem : na verdade quem era o Seu Antonio realmente ? Era um homem que de vez em quando aparecia em sua casa, viu alguma vezes a sua mãe discutir com ele, e ultimamente a sua mãe com o aparecimento da doença obrigava-o a chamar o Seu Antonio de pai. Alfredo o chamava apenas por chamar, mas sem convicção. E onde estaria este homem que não apareceu no velório e nem estava no enterro ?
Após o enterro, Alfredo foi dormir na casa de uma das vizinhas, dona Creusa , antes da janta ela disse-lhe:
- Alfredo, amanhã você vai na tua casa e pega as tuas coisas, umas roupinhas, porque o Seu Antonio virá te buscar para morar com ele.
Apesar de poucas coisas Alfredo perguntou angustiado :
- Mas e as coisas de minha mãe ?
- O Seu Antonio já passou hoje por aqui durante o enterro com uma carroça e já levou as coisinhas que vocês tinham, só falta as tuas roupas eu acho.
Quase choroso Alfredo ficou parado pensando e sentindo uma forte sensação de perda.
- Vai dormir agora, vai menino, não fica assim não, agora você vai morar melhor que a gente, vai morar mais bem perto da cidade numa casa melhor; não é casebre como aqui neste vilinha, não vai mais precisar trabalhar como ajudante na olaria.
Alfredo foi dormir triste, com sentimento de insegurança, já sentia saudades de sua mãe.
No dia seguinte foi até a sua casa pegar as suas coisas, lá dentro sem os parcos móveis reparou quão paupérrimo era o casebre: três cômodos mais o banheiro que era pra fora, o fogão à lenha quase todo quebrado, teto sem forro que no frio gelava lá dentro, e que roupa haveria de pegar? Não tinha quase nada. O menino apesar de dez anos apenas era maduro para a idade devido a vida dura e sofrida, sentou no chão chorando sentindo o vazia do lugar e o vazio da ausência de sua mãe.
Mais tarde refeito ficou sentado em frente ao casebre onde sentava todas as tardes admirando o pôr do sol, era a última vez que dali admirava além do pôr do sol, admirava as águas tranqüilas do Rio Paraíba . Ficou ali sentado umas duas horas esperando o Seu Antonio, que parecia tê-lo esquecido, até que numa carroça ele chegou.
Antonio sem descer da carroça perguntou-lhe:
- Pegou todas as sua coisas ?
O menino só respondeu afirmativamente com a cabeça.
- Então sobe!
Há caminho, os dois lado-a-lado não trocavam uma conversa, Antonio reparou no silêncio, e reparou também que nunca trocou uma palavra com o menino todo o tempo que visitou àquela casa . O menino era seu filho apesar de admitir, mas nunca o aceitou, viu que errou em ter um caso com a mãe dele, errou profundamente, pois ele tinha uma mulher e dois filhos, sempre tentou evitar Alfredo e a sua mãe, mas depois da doença dela ele não podia deixá-la ao desamparo, ela fez ele prometer que cuidaria de Alfredo, ele, apesar de tudo tinha uma moral, não conseguiria abandonar o menino à vida .
Antonio era um homem desgostoso da vida, era pessimista mas calmo, sério. Trabalhava como ferreiro na cidade, morava numa casa simples numa rua de muitos vizinhos. Era um homem de pouca conversa e reservado. Sentia que tinha obrigação de criar Alfredo, mas já enfrentava muita briga com a mulher que não queria o menino em sua casa, mas iria criar assim mesmo, era ele quem mandava na casa e sua vontade é que predominava, pensava Antonio.

Do outro lado da cidade, os dois chegaram na casa de Antonio :ficava num bairro com muitas casas, em uma rua que tinha até armazém e muita crianças. Alfredo surpreso olhava tudo como novidade, pois nunca foi naquela região, o máximo que ia era na missa na igreja Matriz no centro da cidade.
Alfredo desceu da carroça ficando parado do lado de fora da porta da frente, onde estavam curiosos os outros dois filhos de Antonio : Ramiro de onze anos e Judite de sete anos de idade. Os dois ficaram ali olhando para àquele menino estranho que iria morar ali com eles mas com muitas interrogações não entendendo o porquê.
Antonio que tinha levado a carroça no quintal que era um terreno lateral da casa onde ficava o galinheiro e uma hortinha com alguma árvores de jabuticaba , goiabeira e mangueira, disse para Alfredo:
- Entre Alfredo! E vocês dois vão entrado também!
Lá dentro Antonio pegou uma caneca despejando um pouco de café e bebendo quase num gole. Alfredo timidamente entrou segurando a trouxinha de roupa reparando que aquela casa era bem melhor do que a sua, o fogão à lenha era bem maior, quando uma mulher baixa com um lenço na cabeça característico de dona de casa entrou olhando feio para Alfredo dizendo ríspida para Antonio :
- Ocê num tem vergonha mesmo, né Tonho?! Ocê trouxe esse menino filho de sua sem-vergonhice aqui pra nossa casa né?!
- Aurora, Aurora... eu já te falei que não posso largar esse menino aí pro mundo... e ele vai ficar aqui sim senhora... eu já te falei, eu já te falei !
- É... não tem jeito mesmo né?! Espero que não tenha outros mais por aí e não vai encher essa casa com um monte de moleque – Aurora nervosa saiu levando os outros dois. Antonio parado carrancudo olhou para Alfredo e disse :
- Infelizmente menino, vai ter que morar com uma pessoa que não gosta de você, mas pelo menos não está largado por aí abandonado.
Com o coração apertado, Alfredo foi levado para conhecer a casa e a sua cama, ele iria dormir no mesmo quarto de Ramiro, a Judite no quarto dos pais. Olhando tudo perguntou :
- Cadê as coisas de minha mãe?
- Eu tive que dar cabo delas, não posso trazer aqui – respondeu Antonio ríspido.
Umas duas horas depois que Alfredo sentado na cama sozinho se sentia paralisado numa mistura de medo e angústia viu Ramiro entrar e, como influenciado pela mãe autoritário falou :
- Aqui são as minhas gavetas e aqui é a minha cama, não quero que mexa nas minhas coisas... vai lá que a minha mãe está mandando você ir lá na sala !
Alfredo com o coração disparando sentindo-se desprotegido porque Antonio tinha ido trabalhar foi ver o que dona Aurora queria. Chegando, ela falou :
- Escuta aqui menino...já que tem que ficar aqui não tem que ficar na preguiça não ! O que ocê fazia ? Ocê ia pra escola ? Trabaiava ?
- Eu parei este ano para ajudar na olaria. – disse Alfredo.
- Se ajudava na olaria tem o corpo bom pra carpir. Amanhã já vai fazer limpeza lá fora que o mato já tá grande. Não vai ter corpo mole aqui não menino.

Os dias e meses que se seguiram, foram de adaptação à nova vida de Alfredo. Passou a conhecer melhor o bairro, lentamente fez novas amizades apesar da curiosidade de outros meninos. Passou a fazer a maior parte do serviço mais pesado da casa, ganhando a antipatia de Ramiro por influência de sua mãe, pois dona Aurora não conseguia se simpatizar com Alfredo porque via-o como fruto de traição de seu marido.
O bairro era de muitas casas simples, com um pequeno armazém no começo da rua principal e algumas casas com muitas árvores frutíferas. Igualmente, uma grande quantidade de crianças, que em pouco tempo Alfredo foi aos poucos fazendo amizade. No começo, foi aproximação por curiosidade dos meninos daquela rua em ver àquele menino estranho chegar e morar de repente na casa de Ramiro, mas depois a afinidade prevaleceu.
Apesar do serviço da casa, Alfredo tinha tempo também de brincar,e Ramiro fazia o máximo em isolar Alfredo dos meninos. Sendo que num dia Ramiro teve uma idéia :
- Para que Alfredo possa brincar com a gente, ele vai ter passar por uma prova! – disse Ramiro desafiador.
Os outros meninos curiosos quiseram saber qual prova :
- Mas nunca tivemos que ter prova. – indagou Sabiá, um menino que só andava com o seu estilingue.
- É... mas vai ser ... vai ter que fazer! – disse Virgulino achando divertido.
Alfredo sabendo da intenção de Ramiro perguntou :
- Que prova vou ter que fazer, Ramiro ?
- É simples – respondeu Ramiro malicioso – você vai ter que pegar um saquinho cheio de araçá lá da casa do lobisomem.
Os meninos ficaram assustados pelo desafio que era perigoso para eles. O lobisomem que eles chamavam era um senhor, seu Renato que usava barba, morava numa chácara quase no final do bairro, vivendo mais isolado do resto. Toda criançada acreditava que o seu Renato à noite virava lobisomem, onde muitos juravam que já o vira se transformar, e muitos adultos achavam que ele era macumbeiro.
Algumas vezes já, numa mistura de aventura e desafio, alguns pegaram manga mas subindo apenas no muro mais longe da casa, sendo mais fácil para correr. Todos ali sabiam que o pé de araçá ficava mais no meio da chácara, portanto, mais perigoso. E, pelo fato de seu Renato nunca reclamar, acreditavam que qualquer noite sem esperar, ele como lobisomem iria pegar àqueles que roubaram manga de sua propriedade.
- Nossa, o pé de araçá fica no meio da chácara. – disse Ditinho
- Por isso mesmo – completou Ramiro – seria mais fácil para Alfredo se pegasse manga do pé que fica perto do muro, assim não tem graça, assim até eu.
- Então Alfredo? – perguntou Paulinho.
Alfredo meio que receoso e pressionado respondeu :
- É... Amanhã ou o outro dia eu irei.
- Só quero ver – disse Ramiro desafiador e duvidando.

O desafio para Alfredo pertubou a sua paz. Primeiro porque não gostava de ter que invadir o terreno dos outros para pegar fruta, o que era muito comum ali para os meninos, segundo, ele raramente viu o seu Renato , mas conhecia a sua fama de lobisomem. Lembrou que uma vez à noite os cachorros latiram muito, eles assustados porque o seu Antonio não estava na casa pois ficava até de madrugada jogando carta no armazém. Dona Aurora da cozinha olhando pela janela segurando um lampião disse :
- É o seu Renato que passou aqui pelo lado da rua. Ainda bem que ele tá normal, mas não adianta os cachorros sentem o lobisomem. Deve estar fazendo alguma macumba.
Dona Aurora era adulta, e se ela acreditava , então era verdade que o seu Renato é mesmo lobisomem. Mas Alfredo com este pensamento foi perguntar para o seu Laerte o que ele achava.
Seu Laerte era um senhor de seus setenta anos que morava num casebre e sua esposa dona Etelvina. Era contador de estórias de assombração, onde, quase todos os dias ao escurecer, os meninos iam ouvi-lo, e a cada dia as estórias era mais assustadoras.
Passando pela rua encontrou o seu Laerte sentado num banquinho ao lado da porta da frente da casa. Sentando ao lado perguntou :
- Seu Laerte, o senhor já contou estórias de lobisomem, o senhor acha que o seu Renato é um lobisomem?
Seu Laerte ficou olhando para Alfredo pensando, o que deu mau pressentimento ao menino :
- Bom, Alfredo – disse pausadamente o velho desdentado – você sabe que esse homem é meio esquisito, e que todo mundo fica falando que ele é lobisomem .
Dando uma tragada em seu cigarro de palha e segurando no braço do menino falou em tom confidencial :
- Mas eu afirmo que ele é realmente um lobisomem – falou confirmando com a cabeça.
Alfredo recebeu esta revelação temeroso, ainda mais opinião vindo da parte de seu Laerte .
- Se o senhor está afirmando, então é verdade! – confirmou Alfredo desanimado.
Seu Laerte dando uma última tragada e jogando a bita fora soltando a fumaça disse:
- Uma vez eu fui levar um cavalo lá pra um compadre que mora meio afastado daqui à tarde. Lá com ele, bebemos umas pingas, a conversa foi longe e quando dei por mim já estava escuro. Então fiquei meio preocupado para vir sozinho, pois o caminho é só uma estradinha que quase ninguém passa lá, só o pessoal que mora daquele lado, só eles. Eu sempre estou preparado , eu nunca largo da minha espingarda, é “véia” mas quando o chumbo pega, é forte.
Com a narrativa, a imaginação de Alfredo acompanhava a cena.
- Então – continuou o velho – eu vim tranqüilo porque se você ficar com medo, ficar pensando em assombração ou no saci , é aí que eles aparecem. Aliás já acertei chumbo num saci, mas é outra estória. Como dizia, eu vim procurando pensar nos meus negócios, numas galinhas e porcos que estava pensando em comprar, mas... de repente ... escutei um barulho como se vinha atrás de mim.
- Nossa... o que o senhor fez?
- Eu parei e armei a minha espingarda com calma, porque “tô” acostumado com estas coisas assombradas.
- E estava muito escuro?
- Então... era noite de lua cheia, mas de lado não enxergava nada, era só mato. Mas continuei a andar mas com a “oreia” em pé. Uns “déis” passos na frente escutei um andar diferente e um grunhido, continuei andando desconfiava que era o lobisomem, era lua cheia como te falei.
Alfredo nervoso e ansioso no final da estória :
- Quando – disse o velho – dei mais uns passos, parei de repente e escutei que a coisa estava do meu lado na mata, e quando ele grunhiu como se fosse me atacar, meti chumbo nele e escutei o bicho correr bem longe dali, mas cheguei bem em casa, já “ tô” acostumado com essas coisas assobradas.
- Nossa... o senhor não ficou com medo?
- Como eu disse, já é comum essas coisas. Mas então adivinha o que aconteceu?
- Não imagino.
Seu Laerte se inclinou para Alfredo como se fosse contar algo bem secreto disse:
- No dia seguinte o seu Renato apareceu ferido com tiro de chumbo, isso mostra que ele levou o tiro como lobisomem, correu e depois que virou homem com o ferimento.
Alfredo ficou muito assustado, principalmente na forma que seu Laerte conta as estórias. Se despediu do velho mas temeroso com a realidade que recebeu.
Quando Alfredo foi embora o velho ficou rindo da inocência do menino. A dona Etelvina lá de dentro ouvira a estória, se levantou e bronqueou :
- Ô meu “veio”, você assustou o menino, tem que parar de falar essas mentiras para eles! E também coitado do seu Renato, ele é um homem tão bom.Não tem que ficar chamando ele de lobisomem !
- Não adianta,véia, contar essas estórias é igual pinga, agora não consigo parar...ha,há,há...

No dia seguinte, após uma noite de insônia, onde na escuridão do quarto que ainda era-lhe estranho, ficou atento à todos barulhos : como do vento emburrando as folhagens, nos latidos dos cachorros, nas vozes de quem passavam lá fora. Estava decidido no seu íntimo, pois, não podia se mostrar covarde, principalmente para Ramiro. Se desistisse não poderia encarar os seus novos colegas e ter que sofrer a superioridade de Ramiro.
À tarde embaixo do pé de mangueira no terreno sem cercado do seu Simão, lá todos se encontraram, a maioria ansiosos da difícil tarefa. Ramiro sabia que tinha colocado Alfredo numa situação difícil e favorável às suas pretensões de prejudicar o seu meio irmão: Alfredo poderia ser pego pelo lobisomem, poderia desistir e ser eternamente chamado de “ mariquinha” e medroso, ele Ramiro, poderia delatar Alfredo para seu pai que ele roubou fruta da casa do lobisomem, pois, seu Antonio era rígido, não admitia que um seus filhos pulasse muro dos outros, etc.
Todos falavam animados :
- Você vai ter coragem, Alfredo, de pular na casa do lobisomem ? – Perguntou Sabiá.
- Só quero ver, só quero ver... – falava e pulava ao mesmo tempo ansioso o Romeu.
Ramiro dando um saco de papel à Alfredo disse:
- Tem que estar até a boca. Se pegar pouco vai ter que fazer de novo!
- Nossa... nossa...hi! – falava o Piolho, que era um menino que só andava sujo.
Alfredo pegou o saquinho mostrando tranqüilidade mas nervoso por dentro disse :
- Ele virá bem cheio, mas pena que você não vai ganhar nenhum !
Foi então na direção da casa de seu Renato e todos foram atrás para acompanhar a aventura.
Pelo muro de trás da casa todos pararam e como era baixo puderam ficar olhando :
- Pode ir Alfredo – disse Sabiá – se ele aparecer a gente te avisa.
Alfredo subiu no muro e ficou estudando o terreno : a casa ficava mais ao meio cercada por algumas árvores, o pé de araçá ficava alguns passos dela, não tinha cachorro e parecia que ele não estava lá.
- Vai devagar que ele fica quieto dentro da casa – disse Altamiro – Acho que ele fica dormindo pra noite sair como lobisomem !
- Não – replicou Gonzaquinha, um menino bem barrigudo – ele só vira lobisomem quando tem lua cheia, foi o que o seu Laerte disse.
Alfredo não ouvindo os comentários de cócoras em cima do muro achou que poderia ir, pois ali estava muito silencioso.
Pulando para dentro, parou um instante observando, viu ainda tudo aquito foi bem devagar se escondendo nos troncos de árvore em árvore. Seu coração batia tão forte que parecia que ia sair pela boca, que em cada paradinha procurava respirar fundo suando muito.
Quando chegou no pé de araçá, verificou ainda em sua volta e satisfeito que a árvore era fácil de subir. Com cuidado foi subindo tentando se esconder entre as folhagens, escutando lá do muro as vozinhas de seus colegas que pareciam não acreditar.
Lá em cima parou um pouco para relaxar e respirar, pois a primeira etapa já conseguiu, só faltava recolher as frutas e sair dali. Olhando mais uma vez em sua volta para certificar, começou a apanhar enchendo o saquinho.
Lá do outro lado do muro, os meninos estavam apreensivos :
- Nossa, ele conseguiu subir... – disse Sabiá
- Nunca ninguém teve a coragem como ele – disse Piolho.
- Alfredo é muito corajoso mesmo – disse Altamiro.
Ramiro começou a perceber que a admiração crescia para Alfredo, invejoso, viu que tudo estava saindo ao contrário do que esperava. Devagar desceu do apoio que ajudava ver por cima do muro, pegou uma pedra e jogou em direção à casa, onde ela foi bater no zinco que cobria um ranchinho fazendo um barulho estridente e forte.
Todos ficaram espantados não acreditando no feito. Alfredo ficou quieto assustado observado procurando se esconder entre as folhas. Após alguns minutos de silêncio, escuta um ranger da porta de trás da casa, que pelas folhas impediam que ele visse. Escutou passos e viu o seu Renato passar embaixo dele, e ficou reparando naquele homem de cabelos grisalhos e de barba. Seu coração batia muito forte de pavor.
Seu Renato foi para um lado e para outro verificando o barulho, até que entrou novamente pelos fundos. Alfredo não consegui ver mas sentiu o silêncio novamente, e com suas pernas tremendo e apavorado resolveu voltar mesmo sem ter enchido o saquinho, mas o mais importante era sair dali com vida. Passando de um galho mais alto para outro mais em baixo aumentando os movimentos desesperado na ânsia de sair dali rápido, escorregou de repente o pé de um galho ficando somente segurando ficando pendurado. Na tentativa de jogar o pé para um dos galhos e com as mãos suadas pelo medo, não agüentou vindo a cair de uma altura significativa para uma criança. Caiu de pé mas de mau jeito virou violentamente para o lado esquerdo tentando se apoiar mas esfolando o braço . Lá do muro ouvia os meninos apavorados gritando para que ele corresse. Apesar da dor ser muito forte, tentou se levantar, mas quando viu o seu Renato já estava vindo na direção dele, não pode fazer nada, ficou paralisado de pavor, e quando sentiu que ele segurou em seu braço não agüentou e desmaiou por medo e dor. Os meninos ao verem aquilo saíram correndo apavorados.

Alfredo acordou meio tonto abrindo os olhos e estranhando o lugar em que estava. Ele se encontrava deitado num sofá, sentindo o braço doer e reparou que estava com curativos. Sentou lentamente vasculhando o lugar com o olhar: havia muitos livros numa estante que era quase toda uma parede, móveis rústicos quase sem enfeites, mas tudo muito limpo. Escutou que alguém mexia em alguma coisa em outro cômodo, então se lembrou do lobisomem. Ensaiou sair correndo, mas não conseguia se levantar, até que a pessoa do outro cômodo entrou ali, era o seu Renato. Alfredo numa mistura de medo e vergonha de ter sido pego ficou paralisado, reparou nos traços daquele homem, pois nunca o tinha visto de perto e de longe, só ouvira falar dele. A fisionomia calma e até simpática por um instante acalmou Alfredo.
O seu Renato sentou de frente dando um copo de refresco falou :
- Está se sentindo melhor ? Beba isto!
Alfredo pegou o copo e estranhando a calma daquele homem disse :
- Estou sim senhor... só o meu braço que está doendo.
- Fiz um curativo e você vai melhorar logo.
Por uns segundos fez-se silêncio e Alfredo sentiu que o outro observava muito.
- Por que você estava em minha árvore ? – perguntou o seu Renato de repente.
- Eu...é... eu estava pegando araçá.
- E por que não pediu para mim ? Eu tenho muitas árvores e quem quiser eu deixo pegar.
Alfredo não sabia como responder e inventou:
- Eu pensei que não tinha ninguém em casa.
Seu Renato deu um sorriso da mentira do menino e perguntou :
- É você o outro filho do Antonio, o ferreiro?
- Sô sim senhor... a minha mãe morreu.
- É, eu sei. Aqui todo mundo sabe da vida de todos.
Em cima de uma parte da estante, uma miniatura de uma caravela de uns vinte centímetros chamou a atenção de Alfredo, era perfeito, fez lembrar que ele nunca teve um brinquedo descente. Seu Renato percebeu e disse:
- Pode ir lá ver se quiser?
Alfredo se levantou indo na direção da caravela, ficando encantado com os detalhes do mastro, das escadinhas e da proa .
- Bonito não?! Fui eu mesmo quem fiz.
Alfredo olhou de pé para o resto da casa : era tudo em ordem, sóbrio e não viu mais nenhuma coisa que fosse brinquedo, e voltando à realidade lembrou que ali era a casa do lobisomem e também do macumbeiro e falou meio sem jeito:
- Eu tenho que ir embora, vai escurecer ...
- É, senão vão sentir a sua falta, mas você deve voltar aqui para trocar os curativos e não os tire senão pode infeccionar. Pode ficar com a caravela se quiser.
Uma alegria repentina brilhou nos olhos de Alfredo, mas não poderia aceitar daquele homem, muito menos voltar lá para refazer o curativo, e disse:
- Não obrigado, não quero a caravela... tenho que ir.
Seu Renato abriu a porta da frente e lá de fora do portão e disse;
- Então não se esqueça do curativo, é muito importante. E se quiser qualquer fruta é só me pedir.
- Sim senhor – disse Alfredo concordando só para sair rapidinho e completou - muito obrigado, senhor.
Seu Renato ficou observando o menino que mesmo depois de ter caído de uma altura significativa, viu-o sair correndo.

Alfredo foi correndo para casa com os pensamentos confusos, pois seu Renato parecia ser um homem comum e bom, seu semblante transmitia uma certa simpatia; mas e se ele não fosse assim tão bom ?
Os pensamentos de Alfredo foram interrompidos quando chegou em sua casa, onde Ramiro estava na porta como esperando-o com ar superior e disse :
- Se o lobisomem te pegou agora você é um também...mas entra que o “meu” pai está te esperando.
Alfredo sentiu que as coisas não estavam bem lá dentro, lentamente entrou assustado até que escutou o seu pai da cozinha lhe chamar:
- Venha aqui Alfredo !
A voz anunciava que ele estava bravo, até que chegou na cozinha e viu que estava a dona Aurora também .
- Onde que você estava? – perguntou o seu Antonio se levantando.
Alfredo não respondeu por medo.
- Só quero ver – disse dona Aurora provocando – se fosse um dos meus “ôce” já tinha metido reio neles!
- Você pulou no terreno dos outros pra roubar araçá? – perguntou Antonio como se não tivesse ouvido a sua mulher.
- Ele pulou , claro que pulou ... já é um ladrãozinho – repetiu dona Aurora nervosa.
- Escuta aqui moleque – falou Antonio tirando a cinta – aqui eu não sustento quem quer viver na vagabundisse – e com raiva surrou Alfredo, onde o menino apanhou ouvindo a dona Aurora falando:
- É isso “memo”...é reio merecido.
Alfredo depois de apanhar muito, foi para o quarto de castigo chorando muito, chorava não da dor pela cinta mas uma dor moral que desconhecia. Não entendia toda aquela raiva, a sua madrasta que não o suportava e a armadilha provocada pelo Ramiro. Ficou sentado chorando num canto perto da sua cama, um choro que alguns minutos foi passando e de braços cruzados sobre a cabeça ficou horas ali. Sem perceber que escurecia, seus pensamentos atrapalhados clamava pela sua mãe, ela que nunca lhe batera e sempre na sua simplicidade educava-o com muito diálogo fazendo enxergar o certo e o errado. Entendeu após refletir em sua situação, que Antonio na verdade era-lhe um estranho, não era um pai e o sustentava como um fardo . Um sentimento estranho o fez comparar seu pai com o seu Renato, porque este último lhe foi por alguns minutos mais atencioso do que o seu pai, parecia que já conhecia o seu Renato à muito tempo.
Após bater em Alfredo, Antonio sentiu um mal estar, onde a presença de Aurora era-lhe insuportável. Pegou o chapéu e saiu em direção de um bar mais perto da cidade. No caminho se sentia perturbado, viu que batera em Alfredo mais com raiva de Aurora do que com o menino que sofreu as conseqüências do acúmulo de desentendimento de seu mal relacionamento. Não agüentava Aurora à muito tempo e por isso teve um relacionamento com a mãe de Alfredo, que aliás, não tinha certeza que esse menino era seu filho realmente. Falando com sigo disse:
- Só estou com Aurora porque sou um homem de moral, se casei tenho que agüentar... mas estou com Alfredo porque não posso deixar uma criança abandonada...e se ele for realmente o meu filho, mas acho que não é! Antonio chegou no bar e começou a beber cachaça tentando esquecer a sua agonia .
Dois dias depois, Alfredo sentia dores dos machucados no braço, foi até o armazém buscar feijão quando o seu Pereira, o dono, reparou nos curativos já sujos e disse:
- Que é isso no braço menino? Tá na hora de trocar esse curativo!
- Eu caí da árvore!
- Precisa trocar isso ai menino. Quem fêz ?
- Foi o lob..foi o seu Renato!
- Então você tem que voltar lá para refazer. Ele não mandou voltar?
Alfredo só balançou a cabeça afirmando de olhos abaixados
- Que que é, menino, tá com medo dele?
Diante do silêncio do menino seu Pereira continuou:
- Já sei, é esta estória de lobisomem, não é?
- É.
- Larga de besteira menino, esta coisa de lobisomem é bobagem. O seu Renato é o homem mais bondoso que já conheci.
Alfredo olhou para o seu Pereira espantado, pois era a primeira pessoa séria que desmentia o fato de seu Renato ser o lobisomem:
- O senhor acha mesmo que ele não é o lobisomem?
- Claro que não, pára com isso. O seu Renato só faz coisas bondosas. É esse povinho ignorante que fica falando umas besteiras dessas.
Para Alfredo aquelas palavras e convicção impactaram em seu ser, realmente, o seu Renato de certa forma deixou-lhe uma impressão boa.
- Tó aqui, leva o feijão e vai imediatamente trocar esses curativos menino.
Alfredo ficou o dia todo com conflito em sua cabeça, pois as palavras de seu Pereira foram muito convincentes. Mas a dúvida ficava martelando-o: ir ou não ir na casa de seu Renato? Sentia que algo o atraía para lá. Até que resoluto resolveu ir, mas ainda com receio.
Chegando ao portão, seu coração batia forte e bateu forte também anunciando a sua chegada. Lá de fora ficou esperando até que escutou os passos vindo, era ele, quase deu meia volta correndo, mas parecia que alguma coisa o segurava ali.
Seu Renato abriu o portão e surpreso viu Alfredo . E sorrindo disse:
- Ora que bom que você voltou, eu estava preocupado com o seus ferimentos. Já estava pensando ir em sua casa. Entre por favor.
Alfredo de repente sentiu uma calma pela simpatia transmitida por aquele senhor e entrou com o seu Renato o acompanhando para o interior da casa apoiando simpaticamente nos ombros do menino.
Lá dentro o seu Renato pediu para Alfredo sentar e preparou e começou a trocar os curativos e disse:
- Vai arder um pouca está bem. Mas vai ficar bom .
A troca do curativo foi feito sem que Alfredo reclamasse apesar do incomodo da ardidura .
- Pronto – disse seu Renato terminando o curativo – Você é corajoso mesmo, nem fez cara feia – disse dando uma risadinha reparando na seriedade do menino.
Seu Renato foi até a cozinha e trouxe uma jarra de refresco com um copo para cada um, e após servir perguntou :
- Por que você demorou para vir aqui trocar o curativo?
Alfredo ficou mudo pela pergunta direta e não soube responder até que seu Renato continuou para não intimidar o menino mais ainda:
- Já sei, ficou com medo porque você pensa que sou lobisomem, não é?
Alfredo sem jeito segurando o copo não soube responder. Seu Renato sorrindo da inocência do menino complementou:
- Não precisa ficar com medo porque não sou nenhum lobisomem, estas estórias são folclore. Com o tempo você me conhecendo melhor irá ver que isto tudo é bobagem.
Seu Renato procurou ali criar um diálogo de aproximação, e Alfredo foi sentindo uma simpatia por ele, por seu jeito simples, seu ar bondoso e se soltando mais.
Num dado momento seu Renato notando que os livros nas estantes chamavam a atenção de Alfredo perguntou :
- Você gosta de leitura?
- Gosto de ver as figuras... não sei ler muito bem ainda!
Seu Renato foi até a estante e pegou alguns livros colocando-os na mesa para Alfredo. O menino sentia uma atração por livros e ficou maravilhado pela riqueza de figuras e a quantidade de romances e aventuras de piratas e bandeirantes que desbravavam os sertões do Brasil.
- Você não freqüenta a escola? – perguntou seu Renato curioso sentido a vida sofrida daquele menino.
- Eu parei este ano, não podia continuar estudando porque tinha que ajudar a minha mãe na olaria, mas uma vizinha me ensinou ...eu estava aprendendo com a minha vizinha.
- Você trabalhava com a sua mãe na olaria? Não é um serviço pesado?
- Ela fazia o trabalho de colocar o barro nas formas e eu recolhia as formas depois do tijolo feito.
Alfredo falava mas sem deixar de virar as páginas dos livros, manuseado curioso. Seu Renato sentia compaixão por aquela alma sofrida.
- Vamos fazer um trato, ou melhor um acordo? Se você quiser eu vou continuar a te ensinar a ler e escrever, fazer continhas de vezes, de somar, de mais e de menos até o ano que vêm quando começar as aulas, pois nós já estamos em outubro, assim você já estará preparado. Eu conheço o diretor dessa escola ali depois daquela rua que desce cheia de bambuzal. O que você acha?
Alfredo ficou entusiasmado e envergonhado disse:
- Não sei...vou perguntar ao seu Antonio.
- Antonio não é o seu pai? – perguntou seu Renato confuso pela formalidade do menino.
- A minha mãe antes de morrer me falou que ele é meu pai, mas acho que não é porque ele não gosta de mim... Ele tem já uma família!
Seu Renato ficou meio sem jeito porque sentiu que este assunto era muito delicado para tirar do menino, e disse:
- Bom, de qualquer forma pergunta-lhe se ele te permite estudar aqui. Afinal, deve respeitá-lo antes de tudo, não é?!
Alfredo acenou com a cabeça afirmando e seu Renato disse:
- E pra começar vou te dar um presente – pegou a miniatura da caravela e um livro cheio de ilustração dando para Alfredo – Toma, quero que fique com isto para iniciarmos a nossa amizade e o seu aprendizado, agora espero que não recuse a caravela !
- Obrigado – agradeceu Alfredo sem esperar e surpreso pela aquela gentileza, pois, se sentia mais livre em aceitar.
- Bom, então volte aqui depois de amanhã para trocar o curativo e com a resposta se você vai poder estudar aqui, tá bom?

À noite em sua casa, quando seu Antonio chegou, a dona Aurora falou ao seu marido:
- Esse seu moleque foi outra vez na casa daquele macumbeiro e trouxe umas mandingas!
- Trouxe o quê ? – perguntou seu Renato irritado .
Alfredo escutando a conversa de seu quarto folhando o seu novo livro à luz de uma vela, resolveu enfrentar a situação.
- É “ocê memo”. Fala pra ele o que “se trosse” daquele lobsomem!
Alfredo com medo e inseguro falou o que se passou, o porquê voltou na casa de seu Renato e a proposta de estudo que ele fêz.
O seu Antonio pensativo respondeu:
- É, você vai ter que voltar a estudar e acho bom já que o seu Renato está disposto a lhe ensinar...então pode ir.
Alfredo sentiu um alívio e alegria quando a dona Aurora retrucou:
- Vai deixar ele entrar na casa daquele macumbeiro?
- Que macumbeiro? – perguntou irritado Antonio – Para de besteira, o seu Renato mexe com estas coisas de Espíritos mas não é macumbeiro. Este homem só faz coisas boas. Nem veio aqui reclamar do Alfredo tentar roubar fruta no terreno dele! Ainda mais, ele se preocupou fazendo os curativos no menino! E pare de chamar ele de lobsomem e macumbeiro, quero que respeite esse homem!
Alfredo voltou para o quarto feliz e encontrou Ramiro perto da caravela olhando.
- Se quiser pode brincar também. – disse Alfredo espontaneamente se rancor.
- Eu não quero esta porcaria. Eu tenho coisa melhor. Não preciso de esmola. – disse Ramiro irônico saindo do quarto.
Alfredo quieto ficou pensando que realmente não conseguiria ter relações com Ramiro, pois no fundo gostaria que aquelas pessoas fossem realmente a sua nova família.

Nos dias que se seguiram, Alfredo passou a freqüentar a casa de seu Renato para estudar. No começo Alfredo ainda tímido, mas depois foi se soltando devido a bondade que o seu Renato inspirava, fazendo valorizar a parte positiva do menino, dando confiança no desenvolvimento intelectual. Mostrava muita paciência e bom método pedagógico ao ensinar Alfredo, que foi aprendendo tudo que precisava aprender.
Os coleguinhas de Alfredo não se conformavam dele freqüentar a casa do lobsomem, mas para Alfredo isso já era bobagem, pois via o seu Renato além de um benfeitor, um amigo. Por isso, Alfredo já não tinha vontade de voltar para casa quando tinha que deixar a hora do estudo, porque naquela casa não era só o estudo que além de passar a gostar, mas também o bem estar da convivência .
Um dia ali findando mais um dia de estudo, fechando o livro, seu Renato notou aquele olhar triste do menino e perguntou:
- O que foi Alfredo? Estava chato o estudo de hoje?
- Não – respondeu lacônico o menino.
- O que é então? Está cansado?
O menino meio sem jeito após um pouco de hesitação disse:
- Tenho que voltar para minha casa!
- E daí? Qual o problema?
- É quê...
- É o quê? – perguntou o seu Renato estranhando a seriedade do menino.
- É que eu não quero voltar mais para lá. Não tenho mais vontade de voltar.
Seu Renato que estava em pé sentou dando a atenção e perguntou:
- Mas por que não quer voltar? Lá é a sua casa. Tem que dar graças a Deus, pois você poderia estar sem uma casa se o seu pai não te trouxesse!
- Eu sei – disse Alfredo não querendo mostrar ingratidão – É que é difícil morar onde as pessoas não gostam da gente. Não tenho liberdade de nada lá, pois a dona Aurora é brava comigo, o seu Antonio também não dá importância para mim, ou mesmo para todos lá, só volta meio bêbado.
Isto era verdade – pensou seu Renato - já o viu no armazém várias vezes exagerando na bebida. Era uma pena, pois o seu Antonio sempre foi um bom trabalhador, homem sério. Mas parece que com a vinda de Alfredo a sua vida perdeu o sentido, perdendo a credibilidade de sua esposa e dos vizinhos daquele bairro, pois o julgamento implacável deles culpava-o apagando os méritos que tanto buscou. Ainda mais com a dúvida se Alfredo era realmente seu filho, sentia-se enganado pela mãe de Alfredo as vezes. O menino tinha a pele mais clara que ele .Se arrependia às vezes, mas não podia deixar mesmo com dúvida, o menino abandonado após a morte da mão dele.
Seu Renato saindo daqueles pensamentos disse:
- Olha Alfredo, Deus nos reserva coisas que a gente nunca imagina, portanto, peço que não pense mais assim, continue respeitando todos de lá, inclusive o seu pai, pois, mesmo que não seja o seu pai ele teve muita honra em não te abandonar, sempre deu assistência para a sua mãe como você mesmo me disse. Lembra-se que a vida dele também não é fácil. Quanto a dona Aurora, tente enxergar a situação dela: uma mulher traída, mal amada, pois talvez não é você que ele não goste, mas o que você representa mesmo se não for filho de Antonio, ou seja, você representa a traição do marido dela.
Seu Renato fez um silêncio esperando o choro de Alfredo se acalmar e continuou:
- Bom, agora limpa este rosto, este ranho, e prometa-me que irá fazer o que lhe pedi?
Alfredo deu um sorriso limpando o nariz com um lenço que seu Renato lhe deu afirmando positivamente com a cabeça.
- E o tempo passa depressa – disse o seu Renato tentando alegrar o menino – já estamos em dezembro. Falta pouco para o ano que vêm e você ir para a escola de verdade heim?!


2

Já passara dois anos, a vida daquela comunidade não mudara muita coisa. Só Alfredo que se destacava nos estudos, pois, Renato era um segundo professor, alimentando o gosto do menino em estudar.
Em sua casa, dona Aurora continuava não suportando de Alfredo gostava quando ele ficava na casa de Renato – quanto menos em casa era melhor – pensava a esposa de Antonio. E Antonio também gostava disso, pois Alfredo não precisaria sofrer a ira de sua mulher. Ramiro crescia um menino forte, só pensava em ser soldado quando crescesse, a antipatia em seu meio irmão continuava forte.
Para Alfredo, Renato era o seu melhor amigo, queria que ele fosse o seu pai de verdade. Tinha total liberdade de entrar e sair da casa, ajudava-o nos trabalhos da casa como : carpir, ou outra reforma na casa. E nesse tempo sempre soube que algumas pessoa durante um dia da semana visitavam seu Renato, e soube pela forma de fofoca dos outros que era sessão de macumba. Alfredo sempre teve vergonha de perguntar ao seu Renato o motivo daquelas visitas, mas numa tarde em que estavam fazendo um pomar criou coragem e perguntou :
- É hoje à noite que o senhor vai receber visitas?
Seu Renato sem parar de cutucar a terra respondeu afirmativamente com um som sem abrir a boca.
- Faz tempo que essa gente visita o senhor né?
- É, já faz tempo.
- Eles são o seu parentes?
- Não – respondeu o seu Renato parando e sentando entendendo a curiosidade do menino – mas são meus conhecidos!
Alfredo sentindo o olhar do outro sentiu-se na obrigação de continuar:
- Outra noite eu vi algumas pessoas chegarem aqui, parecia que havia uma menina doente, meio mole!
Seu Renato com um sorriso no rosto disse:
- Pode-se dizer que ela tem uma perturbação, ela está obsidiada, e nós fazemos sessão para ajudar a pobre criança.
- Obdisi..o quê? – perguntando Alfredo espantado.
- Obsidiada, mas não adianta eu te explicar assim sem fundamentos, eu preciso te ensinar o Espiritismo antes.
- Espiritismo? – perguntou Alfredo surpreso.
- Sim Alfredo, A Doutrina Espírita em seu fundamento.
Alfredo ficou olhando em silêncio como desconfiado e seu Renato completou :
- Sim, todo mundo confunde com macumba mas não tem nada uma coisa com a outra, infelizmente existe muito preconceito contra o Espiritismo. Além das lições de escola que eu te ensino, eu gostaria de te ensinar sobre essa Doutrina que procura ser o Cristianismo primitivo, uma religião que mudou a minha vida, que me deu nova esperança e que me fez entender a vida como ele é. Como seu amigo eu gostaria de passar isto para você.
Alfredo vendo a sinceridade e que ele sendo um homem muito bom, então deduziu que o Espiritismo só poderia ser uma religião boa e respondeu:
- Eu gostaria, se o senhor achar que será bom para eu conhecer, sem dúvida vou querer sim.
- Ótimo, depois que você entender te convidarei para assistir algumas sessões –e se levantando e preparando para cutucar a terra disse ainda - Então amanhã ao invés de estudarmos geografia vamos começar a estudar religião, e com um copão de limonada bem gostosa


No dia seguinte quando Alfredo chegou à casa de seu Renato, os dois se refrescaram com refresco e foram sentar embaixo de uma mangueira protegidos pela sua sombra.
- Bom Alfredo – disse o seu Renato – antes de tudo, acho que eu deveria começar com o surgimento do Espiritismo do que os seus fundamentos.
O menino continuou fitando o mais velho prestando atenção.
- No século passado, havia na Europa um divertimento, principalmente à noite, onde as pessoas se reuniam sentados em volta de uma mesa, e, com as mãos apoiadas nela faziam perguntas, onde, com uma regra já estipulada, a mesa sozinha se movimentava dando batidas, ou seja, uma batida era o não ou sim como resposta. Entendeu?
- Sim, a mesa respondia sem que ninguém empurrasse !
- É!, e eram perguntas sem importância. O divertimento era ver a mesa se movimentar. Era uma coisa diferente.
Então, Alan Kardec, que era uma pessoa séria, que tinha uma inclinação às pesquisas científicas, foi uma noite à casa de um seu conhecido ver o fenômeno estranho que estava na moda. Só que Alan Kardec presenciando àquela brincadeira da mesa se movimentar e responder perguntas, achou muito estranho. Então em outro dia, pediu para assistir e fazer algumas perguntas na próxima brincadeira. Quando chegou a segunda vez, Alan Kardec fez algumas perguntas mais sérias a qual a mesa respondeu também. Bom, Alan Kardec analisou : se uma pergunta inteligente é respondida também de uma forma inteligente, uma mesa de matéria inanimada não poderia responder, somente uma outra forma também inteligente é que poderia responder. Então Alan Kardec a partir deste momento começou a pesquisar o tal fenômeno, e descobriu que quem respondia as perguntas eram espíritos de pessoas já mortas. Assim Alan Kardec descobriu o mundo espiritual. Começou a se comunicar com os espíritos através de mediunidades de algumas pessoas, através da escrita pelos espíritos. Catalogou os assuntos , pesquisou com base de muitas perguntas e separando as coerentes e invalidando outras.
Com Alan Kardec nasceu o Espiritismo . Ele não é considerado o fundador, mas o codificador, pois divulgou por livros toda os fundamentos do Espiritismo pela revelação ditada pelos espíritos ao longo de muitos anos.
- Então – disse Alfredo – Alan Kardec só escreveu e divulgou o que os espíritos o revelaram?
- Isso. Ele foi apenas um meio, um intermediário dos espíritos na divulgação do Espiritismo.
- E esses espíritos, são bons?
- Sim. No entanto que o Espiritismo está baseado no Evangelho, nos ensinamento de Jesus, aliás, o Espiritismo é uma Doutrina porque contempla a Religião, a Filosofia e a Ciência.
Pela Religião o Espiritismo à contempla porque como a sua conseqüência é moral, então é balizada no Evangelho; como Filosofia, o Espiritismo contempla toda uma estrutura intermediária entre a religião e a ciência. E a Ciência, o Espiritismo acompanha os passos da ciência na amplitude da evolução do ser humano.
Alfredo acompanhava se esforçando para reter toda àquelas informações, ao que seu Renato disse:
- O importante é você saber que o Espiritismo não é uma seita, ou uma crendice mística ; pelo contrário, o Espiritismo como ciência, se mostra de tal modo ajustado nos parâmetros da lógica e do raciocínio.
- Como é?
- Veja Alfredo – seu Renato se ajeitou se esforçando para ilustrar ao menino – a estória do lobsomem por exemplo.
Seu Renato interrompeu porque Alfredo se pôs a rir.
- É um belo exemplo – disse seu Renato rindo também – Então, o lobsomem é uma crença folclórica e que o povo diz acreditar na sua existência, mas um cientista não irá afirmar a sua existência enquanto não provar. Ele pode até pensar num ser que tem uma mutação, mas não irá afirmar enquanto não se provar. Entendeu? Ou seja, o Espiritismo como uma ciência segue passos empíricos também.
- Eu não sei o que é empírico – disse Alfredo rindo – mas o que o Espiritismo tem com a Umbanda? Tem diferença ou é a mesma coisa?
- Boa pergunta para ajudar a entender o Espiritismo, Alfredo .
A Umbanda é uma Religião séria a qual devemos muito respeitar. A origem dela se deu com a vinda dos negros africanos escravos. Aqui, sofrendo a triste condição, longe da terra natal, trouxeram a sua cultura e religião, externavam-na na forma de música, dança, rituais característicos deles, e não de forma diferente à toda humanidade na história, se comunicavam com os espíritos. Mas aqui no Brasil, país extremamente católico, não foi-lhes permitidos mais a prática religiosa deles, pois os seus deuses, entidades e ritos eram considerados pagãos.
- Pagãos ? – perguntou o menino que nunca ouvira tal palavra antes.
- Pagão é o que não pertence ao Cristianismo. Por exemplo: os gregos e os romanos que adoravam àqueles deuses como Apolo, Zeus, Atena, etc. Os nossos índios quando os portugueses aqui chegaram, para religião deles Tupã era o deus sol. Muitos jesuítas aqui vieram para catequizá-los, ou seja, torná-los cristãos e não mais pagãos.
- Já entendi!
- Então, os escravos para não perderem a sua crença, usaram, ou associaram os santos do Catolicismo mas substituído os nomes dos orixás deles, como : Jesus é Oxalá, Iemanjá é Maria, Oxossi é São Sebastião, Ogum é São Jorge, e etc. Pegaram também toda a estrutura de expressão como o altar e as velas. Assim, nasceu a Umbanda cuja associação, deu-se o nome de "Sincretismo religioso", uma mistura de religião africano com catolicismo, uma religião afro-brasileira.
- E por que ela é confundida com o Espiritismo ? – perguntou o menino curioso.
- Porque na Umbanda se pratica a mediunidade, ou seja, a comunicação com os espíritos.
- Mas então é Espírita também ? Não é ?
- Não Alfredo. A prática da mediunidade não é propriedade do Espiritismo. Pois, a mediunidade é uma faculdade do ser humano. Desde a origem da humanidade já se praticava, como : os egípcios, os hebreus, os gregos, os índios. Então era natural os africanos também praticarem a mediunidade e que se incorporou agora no culto da Umbanda.
O Espiritismo revelou através de estudos e pesquisa o fenômeno da mediunidade, mas ela não é proprietária da prática da mediunidade, assim como as leis da gravidade não são propriedade da ciência física, ou seja, a ciência física apenas às revelou.
E o Espiritismo não pode ser confundida com a Umbanda pelo detalhe que já te falei, ou seja, o Espiritismo é constituído pela Religião, Filosofia e Ciência, quer dizer: ela é lógica, não é dogmática, não é mística, não tem ritual, e é Cristã sem se misturar com outra seita ou religião.
- Então – disse o menino – só pelo fato da prática da mediunidade, confundem a Umbanda com o Espiritismo?
- É Alfredo, é falta de informação de conhecimento da diferença destas duas religiões é que nos faz confundi-las.
- Mas por que já vi algumas pessoas umbandistas falarem que são espíritas?
- É o que acabei de falar para você, Alfredo, estas pessoas não sabem o que é a sua própria religião, elas deveriam estudar melhor para não se confundirem. Bom, o que importa é a bondade que pode-se aprender, como religião há uma grande virtude dela para a evolução do ser humano.
Alfredo ficou olhando para o horizonte como se estivesse refletindo naquelas informações.
- Acho que por hoje chega – disse o seu Renato – o importante é primeiro saber o que é o Espiritismo e como surgiu, daqui pra frente iremos estudar os seus conceitos.
O menino foi embora e seu Renato continuou ali sentado meditando, era-lhe importante ensinar ao menino a verdadeira característica do Espiritismo devagar, pois a Doutrina é simples e complexa ao mesmo tempo. Ele deverá ir pelo lado simples, ensinar-lhe a religiosidade que é baseado nos ensinamentos de Jesus.
Em sua casa, Alfredo à noite jantou mais uma vez sob o clima ruim, pois o seu Antonio chegara bêbado, que o fazia desprezar a família com rispidez.
Antonio nos últimos meses dera por abusar da bebida a ponto de cair na rua. Bebia porque sentia desgosto : não suportava a sua mulher, Ramiro estava se tornando um monstrinho pela influência da mãe, Alfredo era um fardo que ele se deixou enganar pela mãe do garoto, só a Judite era a sua menininha que o alegrava.
Após brigas e xingos da família onde Alfredo só assistia tristemente, ia ao seu quarto que ainda dividia com Ramiro e sem que ele estivesse lá, sentava no canto e ficava pensando em sua mãe. A falta dela era-lhe enorme, cresceu cercado de carinho, apesar da pobreza. Alfredo ficava ali horas e sua vontade era correr para a casa de seu Renato, onde sentia segurança como quando com a sua mãe.

Nos dias que se seguiram a aula de religião, Alfredo descobriu um outro mundo e novas concepções com as lições dadas por seu Renato: como quando aprendeu que o Espírito é imortal, renasce diversas vezes, aprendendo, resgatando, tendo uma nova chance. Que Deus é infinitamente justo e bom, que ele não castiga os seus seres criados.
- Veja – disse o seu Renato numa das vezes para Alfredo – que Deus é o Ser supremo e único, não existe para ele os vícios que nós temos.
- Quer dizer então – perguntou Alfredo – que ele não manda ninguém ao inferno eternamente?
- Obviamente que não. Se ele é infinitamente bom, seria uma contradição de sua parte deixar alguém sofrendo ao fogo eterno.
Assim, foram passando os dias, e Alfredo começou a ter novas concepções em relação à vida e tentar entender o porquê de sua vida ser como é, enxergar a dona Aurora e Ramiro como irmãos numa fase evolutiva aprendendo com a oportunidade que Deus lhes deu, e por isso não tinha qualquer sentimento negativo para eles.
Um dia quando o tema era sobre espíritos bons e espíritos considerados ruins, o seu Renato dizia:
- Os espíritos estão por toda parte, eles nos ajudam ou querem nos fazer mal, porque quando uma pessoa morre, se ela for ruim vai continuar ruim; se for boa vai continuar sendo boa.
Alfredo pensativo perguntou:
- Isso de espírito ruim tem a ver com aquelas pessoas que vem aqui em sua casa?
- Sim, aliás, você entenderá agora o que irei de falar: nós fazemos aqui uma sessão de desobsseção na filha do casal que são meus conhecidos.
Alfredo continuou olhando não entendendo o termo:
- Desobsseção é quando um espírito fica, como poderei dizer.., perturbando alguém, que no nosso caso, há um espírito influenciando a menina.
- Como?
- Os espíritos nos influenciam através da mente. Tentam também sugar nossas energias. Principalmente se a pessoa aceita as sugestões dos espíritos obsessores.
- Mas como afastar estes espíritos? É igual o padre faz? Exorcizando?
- Não, o exorcismo é uma forma forçada. Na sessão de desobisessão nós tentamos esclarecer o espírito obcessor com muita conversa, muita oração e ensinando a pessoa que é obsidiada a mudar também de postura, pois, não adianta você tentar esclarecer o espírito se a pessoa não se ajuda. O principal fator de sucesso depende do próprio obsidiado, ou seja, a pessoa que está sendo influenciado, sofrendo.
Alfredo com expressão curioso perguntou :
- Mas nesse caso da filha do casal, o que está acontecendo?
- Ela é perseguida por um espírito muito revoltado que se chama Teodoro, que busca vingança. Em uma encarnação anterior, essa menina Isabel e Teodoro eram casados. Mas só que Isabel se uniu com um outro homem e, para se livrar de Teodoro e ficar com a sua fortuna e o amante, Isabel envenenou-o de tal forma que parecesse uma morte natural. Assim, Teodoro persegue Isabel numa forma vingativa e cheio de ódio desde o plano espiritual descobrindo-a agora num corpo de criança . Isabel sofre porque traz a dor do arrependimento e culpa, sofrendo dessa forma o poder de Teodoro, que faz ela se enfraquecer.
- Mas vocês conversam com ele explicando isso?
- Sim Alfredo, tentamos mostrar-lhe que a sua atitude não trará paz para ele também. Mas é um processo muito demorado.
Seu Renato dando uma pausa olhou para o céu e disse:
- Vamos parar por hoje Alfredo, está na hora de você voltar para casa.
Alfredo se despedindo de seu amigo saiu sentindo que as novas concepções lhe iluminava a alma.

Antonio passara o dia trabalhando pesado como ferreiro, e em uma das fortes marteladas sentiu uma dor no peito, Parando por um instante enxugou o suor sentando, um de seus colegas perguntou-lhe se estava bem, e ele respondeu:
- Não é nada, só preciso de um gole de aguardente, vai me fazer bem !
- Vai é te matar ,ora essa – respondeu o outro – a pinga está é te tirando a força, isso sim!
- Tirando a força ? – perguntou Antonio irado se levantando – Ainda tenho muita força pra fazer ferradura para todos os cavalos daqui de Pinda sem parar.
- Calma, é que se você continuar bebendo do jeito que bebe vai acabar com a sua saúde!
Antonio nervoso ainda com dor pegou a sua camisa e saiu sem dar resposta ao seu colega que lhe perguntava aonde ele iria,
Na rua Antonio caminhava desconfortado, nervoso, quase falando sozinho, com seus pensamentos conflitados e sentimentos de angustia, até que uma pontada forte obrigou-o a sentar na calçada. A respiração ficou mais difícil com a dor aumentando mais , mais até que como uma miragem viu a mãe de Alfredo ao seu lado, seu olhar era como de expectativa e falou-lhe:
- Seja forte Antonio, pense em Deus, tire esse sentimento do coração para ser tudo mais fácil !
Antonio não compreendendo aquilo sentiu uma paz na aparição dela, sentiu uma vibração leve apesar da dor e num reflexo e lágrimas disse-lhe:
- Perdão por tê-la abandonado ...eu não queria... eu...
- Você não abandonou Alfredo apesar de sua dúvida.
Antonio sentindo o efeito daquelas palavras desencarnou ali na calçada sendo socorrido por transeuntes na rua.

Alfredo estava chegando perto de sua casa viu que havia várias pessoas agitadas e um falatório. Assustado entrou e viu a dona Aurora chorando sendo consolada por algumas vizinhas, Ramiro e Judite também chorando ambos abraçados em sua mãe. Uma das mulheres vendo a inquietação de Alfredo disse-lhe:
- Menino, seu pai morreu!
- Mas...como? – perguntou Alfredo perplexo – Onde ele está?
- O corpo dele ainda está no hospital. Ele morreu de ataque do coração. Logo ele virá para cá e faremos o seu velório.

Nos dias que se seguiram foram tristes para àquelas pessoas que ficaram. Dona Aurora se sentiu desprotegida com a falta de Antonio, Ramiro e Judite sofriam com a morte repentina do pai. Alfredo também se sentia triste, estudava o Espiritismo, mas a realidade da morte parece que foi o seu primeiro encontro das suas novas convicções.
Numa conversa com o seu Renato disse:
- Apesar da minha crença da continuação da vida após a morte, sinto meio estranho!
Seu Renato consolando o menino disse:
- É natural Alfredo, nós estamos mergulhado aqui no plano material, cercado por uma realidade intrínseca de acontecimentos passageiros, e ainda iniciantes nos conhecimentos da espiritualidade. Para entender melhor estas leis da vida espiritual, é preciso também vivê-la buscando conhecimento, sofrendo na aquisição da reforma íntima. Pois não é só pondo as mãos nos livros é que conseguiremos deixar a nossa fé forte.
As palavras de seu Renato : “para entender melhor estas leis da vida espiritual, é preciso também vivê-la”, impressionaram forte na consciência do menino, que num instante lhe soaram como um prenuncio do que viria em seu futuro. E aquele momento de perda já significava o começo.
Após alguns minutos em silêncio, seu Renato percebeu que a morte de seu Antonio trouxe interrogações na cabeça de Alfredo e perguntou:
- Você queria dizer alguma outra coisa, Alfredo?
O menino que parecia confuso disse:
- Eu não sei ao certo o que sinto. Agora que o seu Antonio morreu, parece que tenho culpa por nunca senti-lo meu pai de verdade. Muitas vezes ouvi nas discussões com dona Aurora ele dizer que eu não era o seu filho...e...nunca senti o seu amor... – Alfredo gaguejou ameaçando chorar.
Seu Renato pondo a mão carinhosamente no ombro de Alfredo disse:
- Não sinta culpa nenhuma, ele tinha muita dúvida de sua paternidade, no entanto que ele mantinha uma certa distância e você não conseguia chamá-lo de pai, como agora à pouco você o chamou de “seu Antonio”. Mas o mais importante, e não podemos esquecer disso, é que ele não te abandonou após a morte de sua mãe. Ele teve a coragem de te buscar e criar em seu lar. Assumiu a relação que teve com a sua mãe perante todos e o mais difícil com a dona Aurora. Te deu tudo que podia e dividia igual com Ramiro e a Judite. Portanto Alfredo, não pode existir culpa, mas continuar como você sempre fez em respeitá-lo e guardar na memória só as coisas boas que ele fez. Ele foi um ser que já cumpriu a sua missão e, talvez quem poderia dizer que ele tinha que cumprir um resgate te buscando heim? Só o fato de ficar com você e não te largando era um resgate e outra oportunidade dele. Quem sabe?
Seu Renato deu um sorriso mexendo descabelando Alfredo relaxando e disse:
- Bom, isso, deixa a tristeza e vamos fazer uma oração à ele.
Ambos à sombra do pé de araçá, seu Renato orou inspirando vibração de paz e harmonia.

Alguns meses se passaram e a aula de religião entre Renato e Alfredo havia evoluído muito. Àqueles conhecimentos caíram para o menino como a água que lhe refrescou a alma, como descobrir que Deus não castigava os seres criados por ele deixados no inferno eternamente, mas que Deus era amor puro , criador de Leis para o homem seguir na evolução contínua, mesmo que aos trancos e lentamente. Saber que o espírito é eterno tendo muitos caminhos para evoluir; mas também quanta responsabilidade sentia ao ter consciência de certas verdades da continuação da vida.
Um dia Alfredo chegou meio pensativo para a aula de religião ao qual o mais velho percebeu e perguntou:
- O que foi ? Tem alguma coisa te perturbando a cabeça?
Ao qual Alfredo respondeu:
- É que hoje na escola na aula de religião, Ramiro falou para o frei que eu estava aprendendo Espiritismo. Mas ele foi falar na intenção do frei me repreender, você sabe como ele é!
- E o que aconteceu ? - perguntou Renato curioso.
- O frei me chamou em separado após a aula dele e me perguntou se era verdade, eu confirmei, então de uma forma calma ele me falou um monte de coisa que não me lembro direito.
- Mas que coisas?
- Assim, no sentido de que não deveria continuar a aprender estas coisas. Não dei muita importância, pois eu sei o que quero entender. E como todo mundo, ele mistura Espiritismo com outras religiões, inclusive me falou de macumba.
Os dois riram e Alfredo continuou:
- Mas o que me deixou curioso é que ele me falou que na bíblia está escrito que não devemos consultar espíritos. É verdade isso?
Renato se ajeitou na cadeira num gesto que iria esclarecer este ponto e disse:
- Acho que você não ficou curioso, mas preocupado de aceitar uma crença que age contra a lei de Deus. Porque a palavra “bíblia” é muito forte pois trás uma concepção de livro santo, sagrado, a palavra de Deus. E na verdade realmente está escrito mesmo, porém, precisamos definir na realidade a bíblia.
Alfredo atento estava ansioso pela conclusão e Renato continuou:
- A bíblia é dividida em Velho e Novo Testamento, no Novo Testamento trás os evangelhos , a vida de Jesus, as cartas de Paulo, etc. No Velho Testamento trás os livros de Moisés, livros históricos, como a história do povo hebreu, livros proféticos, poemas como os Salmos.